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Não vamos banalizar a conversa sobre o suicídio

Suicídio Setembro Amarelo

A campanha #SetembroAmarelo está ganhando muita visibilidade! Estou achando ótimo! Pessoas próximas a mim me informaram que telejornais abordaram satisfatoriamente o tema  infelizmente, não consegui assistir. É ótimo que a mídia televisiva decidiu falar sobre o suicídio. Acredito que a mídia foi em grande parte incentivada pela força da campanha Setembro Amarelo. De forma geral, o tema suicídio é um tabu social, e os meios de comunicação preferem não expor e discutir o tema – historicamente falando.
Outras plataformas que prestaram enorme serviço para a visibilidade da campanha, foram as redes sociais. Pessoalmente, pude ver diversas publicações sobre: a importância da prevenção, de falar sobre o assunto na sociedade, combater o tabu e a campanha em si. Mas acredito que a minha impressão é indiscutivelmente parcial, pois tenho uma grande parcela de amigos no Facebook que trabalham com saúde mental.
Pensando nisso vou mostrar alguns dados que pretendem ser imparciais, para mostrar que a Campanha tem tido repercussão geral. Para isso recorri ao Google Trends. É uma ferramenta disponibilizada pela Google, que mostra os volumes das pesquisas relacionadas a temas populares.

Visibilidade ao suicídio

Veja a mudança nos volumes de pesquisa relacionados à “Suicídio” e “Setembro Amarelo” nos últimos 90 dias:


Viu como ocorreu um aumento no volume de pesquisa em relação aos dois termos a partir da transição Agosto-Setembro.
Agora veja nos últimos 5 anos:


Viu como a Campanha Setembro Amarelo foi muito mais pesquisada no ano de 2016?
Não podemos negar. A campanha está muito mais difundida agora do que jamais foi no passado. Portanto, o tema suicídio também está sendo discutido, pois é a finalidade da campanha. E isto é ótimo, tendo em vista que conversar sobre ele, é uma forma efetiva de prevenção.

Visibilidade nas redes sociais

Vamos voltar à contribuição das redes sociais. Vou tomar como referência outra estatística para mostrar que as pessoas têm se engajado na discussão do tema "suicídio". Para isso compartilho dados de duas páginas do Facebook, a página Setembro Amarelo e a página do Centro de Valorização da Vida (o CVV).
Veja como a interação das pessoas com as duas páginas aumentou neste mês de Setembro:

Setembro Amarelo Suicídio


CVV Facebook Setembro

Está evidente pelos dados das redes sociais que as pessoas têm se interessado mais pelo assunto, e querem receber novas informações acerca dele.

O que isso quer dizer?

Isso quer dizer que mais pessoas estão conscientes da existência da campanha, e a tendência é que também estejam sensibilizadas pela temática “suicídio”. Portanto, estão também mais bem informadas e propensas a querer colaborar com a campanha, ajudando possíveis suicidas que buscam apoio e conforto emocional.
Entretanto, há um pequeno problema nisso: Será que todo mundo está preparado para acolher e ouvir estas pessoas?

Conversar com suicidas está sendo banalizado?

Ter boas intenções é condição para ajudar uma pessoa em situação de risco. Entretanto, isso não deve bastar para fornecer ajuda efetiva.

Profissionais da saúde mental, por certo, sabem que é necessário muito mais que boas intenções para prestar o devido suporte emocional às pessoas em sofrimento psicológico. Os suicidas sofrem – e muito! E é natural todos nós direcionar esforços para ajudá-los. Mas será que uma ajuda não-instruída e não-treinada basta?
Recentemente vi a seguinte publicação no Facebook, talvez você também tenha visto:
Setembro Amarelo Suicídio Facebook

É ótimo que as pessoas estejam se dispondo e se abrindo para ajudar as pessoas em sofrimento. Para a saúde pública isso é de inestimável valor – as pessoas estão informadas e sensibilizadas sobre o problema. E, dessa forma, a prevenção ganha forças.
Mas qual o problema nesta imagem especificamente?
  • Um dos problemas é que ela propõe, que as pessoas irão receber CONSELHOS;
  • Outro problema que está implícito é sobre a preparação das pessoas para ouvir atos suicidas.

Vamos tratar dos dois a seguir.

Conversar sobre o suicídio com responsabilidade

Vamos colocar em pauta o primeiro problema. Assim como está neste artigo aqui, que publicamos na semana passada, conselhos não são de grande valia para pessoas depressivas ou suicidas.
O melhor que podemos fazer é simplesmente escutar. Uma escuta com genuíno interesse pelo que a pessoa fala. Com empatia irremediável. Conselhos são da sua experiência, portanto podem ser válidos para você, mas não para o outro. O que te ajuda, provavelmente não é o que a outra pessoa precisa neste momento. Pois vocês estão em momentos existenciais diferentes.
Portanto, as pessoas devem simplesmente escutar!
Existe um conselho, no entanto, que é válido. Na verdade, esta atitude pode ser mais adequadamente caracterizada como uma sugestão e não um conselho. É a sugestão para a pessoa procurar ajuda profissional! Seja de um psiquiatra ou psicólogo. O importante é que seja um profissional da saúde mental. Ou ela pode buscar ajuda do CVV – um pouco mais sobre isso, no final do artigo.
E sobre a preparação das pessoas: quem se dispõe a conversar com suicidas, deve primeiramente voltar-se a si mesmo e refletir. Deve-se fazer perguntas como (e dedicar tempo para pensar sobre elas):
  1. O que pode levar uma pessoa ao suicídio?
  2. O que eu sei sobre esse assunto?
  3. Se eu ouvir relatos extremos, como provavelmente vou reagir?
  4. Como eu lidei com situações semelhantes no passado? Em que fui ouvinte da dificuldade de alguém.
  5. E se eu escutar e conversar e a mesmo assim a pessoa cometer o suicídio? Como vou ficar com isso? Como vai mexer comigo esta experiência?

Enfim, trata-se de um tema que merece essas indispensáveis reflexões, pois não é qualquer um que consegue lidar com a situação 5 acima enumerada. É um tema que mexe com todos, pois é de caráter universal: a vida e o fim dela.
Portanto, não podemos banalizar o suicídio. Devemos ser responsáveis para tratar dele. É dessa forma que realmente conseguiremos ajudar na sua prevenção.

Mas não preocupe se você não se sentir apto a conversar sobre o suicídio. Todo mundo pode e deve ajudar compartilhando o trabalho do Centro de Valorização da Vida, que atua na prevenção do suicídio 24h – por chat online, telefone 141, Skype ou e-mail.

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